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Dr. João Evangelista
Gastro-enterologista

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“Herrar é umano”

Velho companheiro do ser humano, o erro pode ser precursor de grandes benefícios à humanidade, como, por exemplo, a descoberta da penicilina. Sir Alexander Fleming esbarrando a placa de cultura de seus experimentos na janela, provocou sua contaminação, descobrindo, com isso, o famoso antibiótico. Pedro Álvares Cabral, fugindo de uma calmaria, deu com os costados na Terra dos Papagaios; bem, pelo menos é o que dizem! São esses alguns dos erros que favoreceram o mundo.

Pôncio Pilatos errou ao lavar as mãos, embora hoje, certamente, ele não pegaria gripe suína!

Aquela história de Adão comer a maçã, pelo contrário, vem nos causando grandes sentimentos de culpa. Engraçado é que Adão se estrepou, Eva foi punida, mas a cobra saiu ilesa. Embora tendo que se rastejar pelo mundo afora, ela continuou cheia de veneno e ameaçadora. Devido a isso, nós estamos, até hoje, correndo atrás do prejuízo. Observem que até essa frase é errada! Ninguém corre atrás do prejuízo, a gente foge do prejuízo! Lembra também aquela história de dizer: “pois não”, que significa “sim”, e “pois sim”, quer dizer “não”!

Além do ser humano, eu diria que errar pode ser também divino. Quando Deus vai escolher um casal para serem pai e mãe do Seu povo, Ele escolhe Abraão e Sara; ele com 90 anos e ela estéril. Por que não optou por um casal de jovens?! Quando chama também o homem que ia ensinar suas leis para o povo, escolhe Moisés, que era gago!

Depois de ver sua esposa mundana e incrédula flertar com Sodoma e virar uma estátua de sal, o íntegro Ló sobe a montanha e, pasmem, coabita com suas duas filhas! Depois se justifica, dizendo não se lembrar de nada porque estava bêbado!

Voltemos ao presente. As mesmas pessoas que votaram no camaleônico Lula, não param de bradar pelas ruas as três coisas que a gente só deve fazer uma vez na vida: Nascer, morrer e votar no PT.

Eu mesmo, acostumado escrever crônicas arrumadinhas, costurando as letras com carinho, tecendo as palavras com esmero e buscando fazer as frases pulsarem com emoção; acabo de escutar de um leitor: Você é muito chato! Você diz coisa com coisa! Trate de burilar o texto! Evite a seqüência! Abandone o nexo! Despreze a coerência! Trate de usar, sem cerimônia, o encanto do erro!

Muitas vezes, o errado serve de tempero para enriquecer nossa vida. Eu tenho um amigo que jamais chegou sóbrio em casa. Um dia, implorado pela mulher, não bebeu e quando ele chegou ao portão de casa, seus dois cachorros não o deixaram entrar, ameaçando morde-lo. Ele voltou para a rua, entrou num bar, encheu a cara e depois retornou para casa. Os cães, reconhecendo o dono, permitiram sua entrada, enquanto o lambia todo!

Eu sempre me pergunto qual era a intenção de Deus quando criou o ser humano? Tentando justificar, minha mãe sempre diz que eu fui uma das ambições do Pai Celestial. Em momentos de profunda convicção e megalomania, até chego a acreditar, e acabo filosofando: Já não existem mais gênios neste mundo: Beethoven morreu, Einstein morreu, Freud morreu, e eu não ando me sentindo muito bem...

Durante a Segunda Guerra Mundial, Adolf Hitler prometeu ao povo alemão um reino de mil anos. Desmerecendo o inimigo, ele sentenciava: “Quero ver nos olhos dos jovens alemães o brilho da ave de rapina sobre sua presa!” O crânio do ditador nazista acabou virando cinzeiro na mesa de Stalin, enquanto suas poderosas armas inspiraram aos inimigos criar a internet!

Todavia, o erro mais inusitado que presenciei na vida; que, por sinal, foi gerado por mim mesmo, foi quando eu disse para minha namorada: “Que o amor seja eterno enquanto o tédio não chega!” Depois de uma semana vivendo com uma autista, eu perguntei: O que eu fiz de errado? Ela respondeu: Nasceu!

De tanto terminar e voltar o tal namoro, eu, tentando salvá-lo, apelei: Amor, eu não vivo sem você! Ela retrucou: E nem comigo! Depois disso, ela ajoelhou e clamou ao Criador: Meu Deus! Eu que sempre sonhei com um João maravilhoso em minha vida, olha só o que o senhor me mandou! Alimentado pela rejeição, que é o maior afrodisíaco do mundo, eu a pedi em casamento e ela respondeu: Não! E os dois viveram felizes para sempre!

Assim é a vida: Quanto mais cedo à gente se livrar de um erro, mais cedo à gente estará na direção do próximo!

 

 

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O dízimo maldito

Mal acabara de sair o último fiel, as portas do templo se fecharam, rangendo suas pesadas dobradiças. Lá dentro, os olhos do pregador pousavam sobre a coleta do dia, enquanto seus ágeis dedos, umedecidos pela saliva, iniciavam a contagem do dinheiro. Seu entusiasmado sermão havia compungido os corações das ovelhas, aumentando as ofertas para a Casa de Deus. Distraído com a manipulação das notas, ele não percebeu quando alguém surgiu não se sabe de onde e se aproximou dele. Foi apenas ao ouvir sua voz que o religioso, assustando-se, perguntou: Quem é você?  Como entrou aqui? Vestido com uma túnica negra e causando uma solene impressão, o estranho visitante falou: Não se assuste! Sou um velho conhecido seu! Eu vim cobrar minha parte do dízimo. O quê? Parte do dízimo! Essa décima parte, que recolhemos dos irmãos, é destinada ao Criador. Afinal, quem é você?

Confesso que nunca procurei o senhor para exigir minha porcentagem desse dinheiro, mas ando meio adoentado e necessito de cuidados médicos; por esse motivo estou aqui.

Quem é você? Eu nunca te vi em minha vida!

Aquela bizarra criatura olhou profundamente para o pregador e, com um sorriso malicioso, disse: O senhor sabe quem eu sou, pois já nos encontramos muitas vezes e tens visto o meu rosto em toda parte. Na verdade, eu sou bastante admirado pelo senhor!

O missionário reagiu, protestando: Mentiroso! Crápula! Farsante! Eu nunca vi o seu rosto antes. Jamais darei parte do nosso sagrado dízimo para tratar sua enfermidade.

Disse o enigmático indivíduo: O meu nome é legião!

O pregador gritou, com todos os pulmões: Vade retrum satanás! Seja maldito! Que tu morras no quinto dos infernos!

Demonstrando paciência, embora armado com veemência, o anjo caído respondeu: Há males que vêm pra bem! O senhor não sabe aquilo que está dizendo e não podes calcular o dano que poderá gerar para ti. Eu sou a causa do seu sucesso e prestígio. Sua felicidade e bem-estar não existem sem mim. Desprezas meu valor, mas vives sob minha sombra. Não se deve a minha existência a razão da profissão que o senhor escolheu?!  Por acaso o senhor não se promove as minhas custas, usando o meu nome?! Qual outra atividade o senhor teria escolhido, caso a minha morte apagasse o meu poder?! Há bastante tempo o senhor vem se valendo de mim, advertindo seus fieis contra minhas tentações, e eles, com medo, enchem sua igreja de donativos. Quem iria visitá-lo, e enaltecer suas pregações, caso soubesse que seu inimigo morreu e que eles estão livres de suas maldições?! Inteligente como o senhor é, deves saber que quando uma causa desaparece, as conseqüências desaparecem também; não é mesmo?! Como o senhor irá se virar, caso minha doença progrida e eu morra?! Como explicar o bem, onde já não existe o mal?! Talvez seus fieis não percebam, mas eles rezam mais por temor a mim, do que pelo amor ao seu Deus! Pense nisso.

Já era tarde da noite quando um vulto saiu da igreja carregando alguém nas costas, em direção ao hospital. Lá ia o servo do Altíssimo, com o inimigo sobre os ombros, à procura de salvação material. Durante todo o trajeto que eles percorreram até entrar no Pronto Socorro, o agente do mal foi ouvindo os sussurros do agente do bem, que dizia: Eu já não mais ignoro aquilo que não sabia antes. Perdoe minha ingenuidade, meu caro sócio: Sei que o seu propósito nesse mundo é tentar, e a tentação é a maneira como a Providência talvez meça o valor de nossa fé. Não morras, por favor, senão o mal desaparecerá contigo, libertando as pessoas da prudência, do bom senso, do medo e da oração. Deves continuar vivendo, porque sem ti os seres humanos deixarão de temer o inferno e mergulharão para sempre no pecado. Todo mal traz embutido no seu âmago, um bem qualquer! Quanto maior é o escuro, maior é a nossa percepção do brilho da luz!

Conclusão: É fácil servir ao diabo dando a impressão de estar servindo a Deus! Até o Nazareno se valeu do mal. Com a morte, Jesus venceu a morte!