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Dr. João Evangelista
Gastro-enterologista

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Drogas sobre rodas

Que alguns jovens, freqüentadores de barzinhos e boates, retornam para suas casas, dirigindo embriagados, todo mundo sabe.

Que vários motoristas de caminhões utilizam anfetaminas, tentando melhorar seus rendimentos nas estradas, todo mundo também sabe.

Que muitos cidadãos, diariamente rumo ao trabalho, drogados, guiam seus automóveis, bem...isso poucas pessoas sabem, inclusive eles próprios.

Estamos vivendo uma era medicada. Tentamos resolver, além das doenças, todos os nossos problemas, com remédios. Seria ingênuo afirmar que a humanidade não se beneficia com as surpreendentes descobertas de fármacos, que vem revolucionando o tratamento de inúmeras doenças. Todavia, cabe ao bom senso separar o joio do trigo. A presença sistemática, do marketing irresponsável, da propaganda enganosa, da prescrição exagerada e da omissão dos órgãos de saúde, todos colaboram para dar foros de verdade à tolice de se acreditar que o nosso corpo e a nossa mente necessitam de tratamento para absolutamente tudo, carecendo de defesas naturais e precisando do amparo das drogas para resolverem seus impasses.

Até o Comitê Olímpico Antidoping está perplexo com o excesso de exames positivos encontrados nos seus sadios atletas. Muitos deles fazem uso de fármacos, cujo efeito colateral, possui implicações legais.

Apavora-me, também, observar a presença de tantas pessoas dirigindo, inocentemente, seus veículos, sem perceberem que as drogas tão simples que ingeriram no dia anterior, ameaçam seus reflexos, aptidões e acuidades, colocando em risco suas vidas.

Drogas prosaicas, utilizadas no tratamento da gripe, pressão alta, ansiedade, vômitos, alergia, entre tantas outras, apresentam o efeito de intervirem nas transmissões do sistema nervoso central, alterando seu funcionamento. As células nervosas possuem braços denominados axônios e dendritos. A ligação dessas estruturas forma verdadeiros cabos onde trafegam as mensagens cerebrais. A união de um axônio com um dendrito, chama-se sinapse. Nessa região operam substâncias denominadas neurotransmissores. Serotonina, Dopamina, Noradrenalina, entre outras, são catecolaminas responsáveis pela aceleração, bloqueio ou redução de um determinado estímulo nervoso. Inúmeros medicamentos interferem no trabalho desses neurotransmissores, inibindo ou estimulando suas ações.

Semana passada, eu prestei socorro a uma senhora que havia batido com seu carro no cruzamento localizado em frente ao aeroporto. Felizmente, após quebrar a cerca colocada nas margens da pista para avisar a presença de obras, derrubando dezenas daqueles cones perfilados ao longo do canteiro, e atropelando a motocicleta do policial de trânsito, que por sorte operava seu apito a dez metros de distância, a mulher apenas deslocou sua clavícula. Interrogada sobre como conseguiu tal proeza, ela, meio apática, não sabia o que responder. Perguntei se havia tomado algum medicamento. Informou-me ser usuária da droga Bromazepam, fazendo uso dela todas as noites. Esse ansiolítico retira a ansiedade, relaxa e faz dormir. Todavia apresenta um imperceptível efeito residual, alterando os reflexos do indivíduo até 36 horas depois de administrado.

Enquanto eu tratava de acalmar o guarda, que olhava sua moto sucateada, a motorista perguntava para o seu cachorro, deitado no banco de trás do automóvel: Rex! Você se machucou?

O pequeno cão, completamente desorientado, olhava para ela, sem nada entender.

Rex! “Fale” alguma coisa?

Ela jurou ter ouvido o Rex responder: Hã? Hã? Miau! Miau!

Motorista! Cuidado! Talvez o seu Anjo da Guarda, amante de uma vida saudável, alimentação equilibrada, exercícios físicos e adepto ao uso racional de remédios; resolva tirar umas férias, e te deixe sozinho no volante...

 

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