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Dr. João Evangelista
Gastro-enterologista

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A prisão de quem está solto

Todo detento sonha com o término de sua sentença ou com o dia em que conseguirá juntar uma graninha para pagar um bom advogado ou subornar um agente penitenciário e evadir-se de trás das grades. Eles certamente pensam que viver aqui do lado de fora seja realmente todo esse paraíso.

Mas, o certo é que o preço da liberdade está cada vez mais alto. As filas nas repartições, nos bancos, nos hospitais, nos supermercados, nas padarias, nos ônibus, são cada vez mais uma tortura diária. A poluição sonora entra por um ouvido e não sai pelo outro; fica latejando indefinidamente no cérebro. Nas praias, o cidadão enfrenta os esgotos, os cachorros, os carros de som, os surfistas e os arrastões. Nas ruas, o trânsito neurótico aumenta tanto a estatística da morte quanto a dos descontroles emocionais. Nos prédios os assaltos tiram o sono até dos tranqüilizantes. Na burocracia, a pessoa se emaranha em documentos intermináveis: carteira de trabalho, de reservista, de eleitor, de motorista, CPF, SUS, seguro obrigatório, identidade, cartão de crédito, cartão de ponto e também as taxas: água, IR, IPVA, IPTU, ISS, luz, telefones, TV a cabo, condomínio, flanelinhas, estacionamento e pedágio.

Enfim, só resta noite para um descanso, mas quando não é a insônia causada por moradores barulhentos, são os mosquitos que desafiam todo e qualquer inseticida. Alguns tentam escapulir indo para os barzinhos e boates sem perceberem que em cada esquina há sempre um assaltante de plantão, roubando até os bandidos que saíram da prisão.

Muitos meliantes adoecem devido ao encarceramento nos presídios, acometidos por distúrbios nervosos, endócrinos e imunológicos. A prisão atrofia a mente e degenera o organismo, mas quem garante que o homem livre não é também prisioneiro, sujeito às mesmas conseqüências orgânicas de um detento? O ser humano livre está preso 24hs por dia. É escravo de horários, de ônibus, de trabalho, de chefes neuróticos, de funcionários problemáticos, de parentes próximos e distantes, de problemas domésticos, de aniversários, de batismos, de casamentos e de não poder ir aonde quer, à hora que quer, devido à disciplina que a própria condição social lhe impõe.

Talvez, pensa ele, melhor seria se eu rompesse essas correntes éticas, morais e sociais e praticasse um assaltozinho qualquer para poder ir descansar um pouco na cadeia. Mas, nem sempre isso é possível, pois muitas vezes pratica-se um crime e a polícia nunca descobre. Além disso, o cidadão de bem se encontra sempre refém da sua consciência.

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