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Dr. João Evangelista
Gastro-enterologista

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O tempo como remédio

A medicina anda tão evoluída que a indústria farmacêutica vem lançando remédios até para doenças que não existem.

A florida variedade de pacientes que peregrinam nos consultórios médicos alimenta o rendoso mercado das drogas farmacológicas, sejam elas, efetivas ou meros placebos.

Doutor! Eu gostaria que o senhor me prescrevesse uma doença, pois o remédio eu já tenho, informa o paciente enquanto despeja uma sacola cheia de medicamentos sobre a mesa. Frente essa inusitada situação, o profissional demora descobrir que o indivíduo na verdade está pedindo para ele ver se algum daqueles remédios que outros médicos receitaram antes pode ser utilizado para tratar sua misteriosa e recalcitrante patologia.

Setenta por cento das enfermidades que vicejam em nosso corpo, são funcionais, ou seja, não apresentam nenhum substrato orgânico. Em função disso, elas buscam o caminho da cura, espontaneamente.

Eu não quero dizer, com isso, que devemos relaxar frente qualquer queixa de um paciente, ignorando seus sofrimentos, medos e apreensões.

Patologias graves, perigosas, emergentes, que requerem pronta intervenção, pelo risco iminente de morte e pela viabilidade de cura que apresentam, são bastante freqüentes.

Todo sintoma deve ser analisado, entendido, e tratado, inclusive aquele que é utilizado pelo indivíduo para manifestar suas carências, aliviar sua solidão, ou chamar atenção.

Existem pacientes hipocondríacos que são mestres na valorização exagerada de seus sintomas. Pergunta um deles: Doutor! Eu sou diabético! Semana que vem irei ao Rio de Janeiro. Não haverá risco caso eu resolva visitar o Pão de Açúcar?

Ao contrário do que se pensa, esse paciente representa um grave perigo para seus familiares. Acostumados com suas patologias mirabolantes e fantasiosas, até o médico costuma baixar guarda, não percebendo o momento em que ele, efetivamente, estiver doente.

Por outro lado, tropeçamos sempre com pacientes que nada temem, escondendo seus males, evitando com isso, o confronto com a realidade. Um deles, sendo submetido a um check- up, informa: Doutor! Eu quero fazer um exame completo pra ver se está tudo bem. É que eu vou casar!

Quantos anos o senhor tem?

Eu faço noventa e cinco, semana que vem, responde ele ao médico.

E sua noiva?

Vinte e um.

O senhor deve tomar cuidado. Sexo nessa idade pode ser perigoso, não?!

Bom, doutor! Paciência! Se ela morrer, morreu!

Valente ou covarde, o certo é que muitos não se dão conta da importância da doença na vida do ser humano.

Quando adoecemos, muita coisa muda em nós, além de nossas funções orgânicas. Quantos recantos do nosso ser não se terão modificado enquanto sofremos deitados num leito de hospital!

Várias pessoas adoecem e assim permanecem, por não saberem ouvir seus sentimentos, que se tornaram estranhos, se vendo colocada a sós com a estrangeira doença que veio visitá-la. Todavia, é função desse hóspede transformar o ser que ele veio visitar.

A doença é o meio de que o organismo se serve para se libertar de um corpo estranho, seja em si próprio, seja na mente.

Quantas vezes bastam apenas á gente ninar nosso sangue revolto, que nossa pressão volta ao normal!

Talvez por isso a pessoa doente chama-se paciente. Ter paciência frente uma enfermidade é o segredo da cura. Nutrir esperança significa esperar pacientemente, ao contrário de ansiedade, que significa ansiar, esperar com aflição!

A palavra remédio vem de fármaco (Farmakon) que significa enfeitiçar. Por esse motivo a administração de um medicamento em um vácuo emocional nem sempre produz os efeitos esperados pela previsão farmacológica

O primeiro médico do indivíduo enfermo deve ser ele mesmo. Convém procurar compreender os caprichos do seu organismo e dar tempo ao tempo; esse fármaco milagroso! Há dias em que o próprio médico nada pode fazer senão esperar e prescrever tempo!

Nenhum fármaco cria uma função. Ele apenas acelera, retarda ou a modifica. Medicamentos são prescritos apenas para que o corpo tenha tempo de curar a si próprio!

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