PDM de Vila Velha é modificado
O pacote de mudanças aprovado pela Câmara de VV pode trazer transtornos para a cidade, como prédios maiores do que o autorizado anteriormente
Na sessão de 5 de outubro de 2010, a Câmara de Vila Velha aprovou importantes modificação no Plano Diretor do Município. São modificações tão significativas que mereceriam uma audiência pública para discutí-las antes de serem transformadas em Lei. Vejamos algumas delas:
Art. 125: A lei, antes da modificação, previa Estudo de Impacto de Vizinhança para empreendimentos não-residenciais com área construída igual ou superior a 5.000 m². A lei aprovada em outubro/2010 altera este dispositivo para “área computável no coeficiente de aproveitamento igual ou superior a 5.000 m².”
Isto representa uma diferença considerável no tamanho da área dos empreendimentos que ficarão sujeitos ao Estudo de Impacto de Vizinhança - EIV, já que a área computável é somente aquela considerada pelo coeficiente de aproveitamento previsto para cada zona urbanística.
Assim, para efeitos de aplicação do instrumento de controle urbanístico EIV, deixam de ser considerada uma série de áreas específicas que compõem normalmente as construções, tais como as áreas de garagens, circulações horizontais e verticais (áreas de corredores comuns dos pavimentos, áreas de escadas e elevadores), áreas de subestação e casa de máquinas, áreas de usos comuns, tais como salão de festas e salas de ginástica.
A alteração promovida pela lei recentemente aprovada pela Câmara acaba por perverter inteiramente a finalidade do instrumento de controle previsto na lei original do PDM de Vila Velha, já que na prática aumenta em muito o limite para exigência de Estudo de Impacto de Vizinhança.
Dependendo do tipo de obra, o tamanho mínimo em que se passará a exigir EIV passará a ser quase ou mais que o dobro do tamanho previsto originalmente pelo PDM. Ou seja, na prática o que esta nova lei faz é praticamente desobrigar do Estudo de Impacto de Vizinhança a maior parte dos empreendimentos que a princípio, pelo porte e grau de incômodo que poderiam gerar estariam sujeitos ao referido Estudo.
A elaboração de EIV para certos empreendimentos é importante. Alguns empreendimentos tais como indústrias, supermercados e mesmo condomínios residenciais podem se tornar geradores de vários tipos de incômodos ou impactos urbanos.
O incômodo mais comum é o número de carros que passam a ser atraídos para determinada rua ou avenida contribuindo para a geração de engarrafamentos, por exemplo. No caso de construção de empreendimentos comerciais (centros comerciais e shoppings) isto também é bem perceptível.
O Estudo de Impacto Urbano para determinado empreendimento visa exatamente identificar o tipo de impacto que o futuro empreendimento poderá provocar na cidade (tanto do ponto de vista de sua vizinhança mais imediata como em relação aos sistemas urbanos em geral (mobilidade e transporte, abastecimento, etc) e as possíveis medidas para mitigar os problemas identificados, se tal for possível.
Em alguns casos o poder público poderá exigir do empreendedor medidas compensatórias para aprovar o empreendimento. Estas medidas compensatórias podem ser de diversos tipos, tais como obras de melhoramento viário, construção de equipamentos urbanos para a coletividade mais diretamente afetada pelos problemas gerados pelo novo empreendimento, etc.
Ao modificar o limite de área dos empreendimentos para a exigência do EIV, na prática se desobriga o empresariado da construção de sua obrigação social e responsabilidade com os destinos da cidade, promovendo facilidades antes inexistentes para a implementação de empreendimentos cada vez maiores na cidade.
Mais uma modificação preocupante
Anteriormente o artigo 149 previa que o “o pavimento em meio subsolo, quando destinado a guarda de veículos, poderá ocupar toda área remanescente do lote terreno, após a aplicação do afastamento de frente, da taxa e permeabilidade, das normas de iluminação e ventilação...”
Com a alteração o parágrafo segundo deste artigo passa a reger:
§2º os dois primeiros pavimentos poderão ocupar toda a área remanescente, após a aplicação do afastamento frontal de 3m (três metros) e atendida a taxa de permeabilidade e das normas de iluminação e ventilação.
Há uma grande diferença entre pavimento em meio subsolo e os dois primeiros pavimentos, sem mencionar o uso. O artigo anterior tinha a intenção de estimular a construção de garagens. Quanto a esta modificação fica pendente qual a intenção.
Na mesma direção é alterado o art. 150, que, anteriormente, permitia “a soma dos afastamentos laterais em uma das divisas do lote, encostando-se na outra divisa, desde que nesta exista parede cega de uma edificação com gabarito superior a três pavimentos ou mais de 9m (nove metros) de altura”.
A partir de outubro do ano passado, foram acrescidos os §§ 1 e 2, ao artigo 150 com a seguinte redação:
§ 1º Em terrenos com testada igual ou inferior a 15m (quinze metros), para edificações comerciais e/ou hoteleiras, é facultada a supressão do afastamento lateral na divisa, onde exista parede cega de uma edificação com gabarito superior a três pavimentos ou mais de 9m (nove metros) de altura, respeitando-se na outra lateral o afastamento mínimo previsto no Anexo I, Quadro VII, da presente Lei.
§ 2º O disposto no § 1º deste artigo não poderá ser aplicado no caso de terrenos cujos desmembramentos de área maior tenham sido registrados no Cartório de Registro Geral de Imóveis em data posterior à publicação deste Plano Diretor Municipal.” (AC).
Aí os legisladores parece terem-se equivocado, porque a considerar o que consta do PDM no site da Prefeitura, o Quadro VII, do anexo I, trata do Enquadramento das atividades por grau de impacto urbano, e o Quadro VI, sim, trata de afastamentos laterais.
Quem mora no município por mais de uma década sabe o que aconteceu com a legislação, mais generosa para estimular os apart-hoteis, e não há garantia de que o mesmo não vá se repetir.
Considerando que as edificações para fins hoteleiros tendem a se instalar na orla, parece que a modificação vem a agravar o paredão de prédios, que além de desagradáveis do ponto de vista estético, interferem na circulação dos ventos para as demais quadras do bairro.
Há ainda alteração no gabarito e na altura máxima das edificações, excluindo de seu cálculo o pavimento de cobertura (qual a função social da cobertura?) e os dois primeiros pavimentos , conforme o artigo 149.
Foram propostas modificações no mapa de Zoneamento do Município, mas a impossibilidade de acesso a estes mapas impediu qualquer comentário. Enfim, um pacote de mudanças que deveria receber a atenção dos moradores e de suas representações.
Irene Léia Bossois - Economista- Especialista em Políticas Públicas de Gestão e Mestre em Planejamento urbano e Regional (UFRJ)
Paulo Vargas - Arquiteto e Urbanista, Professor Doutor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFES e Conselheiro do CREA-ES